sexta-feira, 26 de julho de 2013

ESCÂNDALO NO PRÉDIO (Crônica)

As mulheres do prédio estavam reunidas na recepção. Todas falando ao mesmo tempo. Esperavam a síndica. Ela chegou minutos depois. Calmamente perguntou qual era a causa daquela agitação toda.

- O primeiro andar tem um grande terraço... - disse dona Manoela.

- E sempre alguém está tomando sol nesse terraço! - enfatizou Vanessa, que estava sentada com a filha de dois anos no colo.

- Não tem nada de errado tomar sol no terraço. Isso não é proibido - disse a síndica.

- Conte, conte, dona Cidinha - incentivou-a Manoela.

- Mas hoje eu vi... Eu estava olhando pela janela, não estava espionando, não.  Hoje eu estava olhando inocentemente pela janela quando vi... - dona Cidinha cobriu o rosto com as mãos e disse descendo a voz: - Vi um homem nu tomando sol no terraço do primeiro andar.

- Era seu Inácio? - perguntou Rosalba, uma antiga moradora.

- Aquele velho contador aposentado tomando sol nu no terraço? - perguntou a síndica.

- Que horror! - disse gritou Manoela.

- Não! Não era ele, não! Era esse sobrinho, esse jovem alto e moreno, parecido com o Rodrigo Santoro.

- Ahhhh! Uauuuu! E outras exclamações surgiram dos lábios das mulheres.

- Aquele rapaz estava tomando sol nu no terraço? Por favor, dona Cidinha, a próxima vez que isso acontecer, me chame imediatamente - disse a síndica - eu quero tirar algumas fotografias daquele gatão nudista!


Isabel Furini é palestrante e escritora, orienta a Oficina Como Escrever Livros no Solar do Rosário. 
e-mail: isabelfurini@hotmail.com

quinta-feira, 25 de julho de 2013

MUDANDO A PERSPECTIVA


         Em literatura há uma técnica chamada “mudança de perspectiva”. Os personagens falam, ou pensam, ou algo acontece, e o leitor descobre uma nova perspectiva de um assunto. É muito interessante descobrir que isso é simplesmente uma maneira de levar a visão do homem para o universo literário. Muitas vezes nossa perspectiva sobre um assunto muda ao conhecer algum fato, ou descobrimos que sustentávamos uma visão errada sobre uma pessoa.
         Lamentavelmente o ser humano não tem raio-x para ver os pensamentos dos outros. Somos facilmente enganados pelas aparências. Um rosto bondoso pode ser na realidade uma máscara para não despertar suspeitas. O sorriso pode esconder raiva ou ressentimento. O olhar doce pode não ser espontâneo, pode ser resultado de algum curso de teatro. A elegância nas palavras, às vezes, nasce da artimanha de seduzir os outros. Além disso, temos os chamados “sintagmas significativos”, ou seja, palavras ou frases que podem ser usadas com a finalidade de manipular os outros.
         Em um mundo no qual a imagem impera, nunca sabemos se quando alguém fala de seu passado está revelando uma verdade escondida, ou está criando uma imagem para ser aceito, amado ou aplaudido. Só conseguimos ver a cor da pele, dos olhos, dos cabelos, não conseguimos saber quais são as intenções das pessoas.
E, como nada é tão horrível ao mundo contemporâneo quanto à honestidade, usamos máscaras. Se as coisas continuarem desse jeito, corremos o perigo de chegar em casa depois de uma festa na qual mentimos – desculpem, fomos gentis e dissemos que os doces dos quais não gostamos eram maravilhosos, excelente o livro recém lançado por algum autor que desprezamos em silêncio, além de elogiar o horrível vestido da anfitriã, chegar em casa e caminhar até o espelho para tirar a máscara e descobrir que sob essa máscara há outra. Tirar a segunda máscara e descobrir mais uma... Ao final, quem poderá dizer que conhece o seu rosto autêntico?


Isabel Furini é escritora e poeta premiada. Autora do livro de poemas “Os Corvos de Van Gogh”. Contato: isabelfurini@hotmail.com

sábado, 20 de julho de 2013

AGENTE SECRETO OU TRAFICANTE??? (Crônica)

O vendedor bonitão dizia “eu sobrevivo dos seios das mulheres”. E era verdade, vendia sutiã. O rapaz inteligente dizia que era garoto de programas... de programas de computador... esclarecia.

Mas um dos casos mais interessantes que escutei foi contado por Janice. Janice conheceu Bento em um barzinho. Ela é secretária e perguntou qual era o trabalho dele. Bento só respondeu: eu faço o trabalho sujo, alguém tem que fazer.

Janice ficou impactada com a resposta e pelos músculos do rapaz. Saíram várias vezes. Ele sempre levava uma mala preta, pequena, de couro e Janice se perguntava que tipo de arma levaria lá dentro. Seria agente secreto ou traficante?

Janice convidou-o a jantar na sua casa. Entraram e Janice apresentou sua mãe. Dona Laurita, encabulada, desculpou-se dizendo que só havia feito um lanche, pois estava esperando o rapaz da desentupidora. Banheiro entupido é uma tristeza – lamentou-se.

Bento, com um sorriso triunfal, abriu sua maleta preta de couro, tirou luvas compridas de borracha e, colocando-as, falou: Não se preocupe, senhora, pois eu já falei para sua filha, eu faço o trabalho sujo. E desentupiu o banheiro.
Isabel Furini é escritora, palestrante e educadora - 

e-mai: isabelfurini@hotmail.com

O PADRE OU O PAI? (Crônica)

            Meu amigo Orlando, que também é argentino e professor, mora em São Paulo onde ministra cursos e palestras. Uma noite, estava ministrando uma palestra e bem na primeira fileira estava sentado um senhor de gravata preta com uma figura enorme de Mickey Mouse em amarelo, que dormitava e havia deixado cair a cabeça de lado. Quando o orador levantava a voz, o homem abria os olhos trabalhosamente e voltava a fechá-los.
            Meu amigo ficou nervoso e, ao falar a biografia de Freud, errou e disse duas vezes “o padre de Freud”, em vez de “o pai de Freud”. Acontece que em espanhol a palavra “padre” tem dois sentidos: de pai e de pároco de igreja. Depois de dizer o padre de Freud pela terceira vez, o homem da primeira fileira abriu os olhos e empertigou-se, meu amigo continuou, mas o homem interrompeu a palestra exclamando: Minha nossa! Isso quer dizer que Freud era filho de um padre? Mas que história interessante! Conte mais, professor.
            Orlando, rindo, desculpou-se, pois havia errado. Esclareceu que a família de Freud era de origem judaica, mas para ele foi muito divertido perceber que o homem havia acordado e ficado atento ao resto da palestra.
Isabel Furini é escritora e poeta premiada - e-mail: isabelfurini@hotmail.com

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Você tem PRECONCEITOS???

Estamos na época em que as pessoas estão tomando consciência de que preconceitos ofendem os outros e não têm fundamento. Muito destrutivo é o preconceito racial. Essa postura absurda de medir as pessoas pela cor da pele.

Outro preconceito é que ser gay é pecado ou doença. A escolha sexual, como a escolha política, religiosa ou profissional, é um direito. As paradas gays, filmes e novelas ajudam as pessoas a diminuir o preconceito.

Existem outros preconceitos menos visíveis, por exemplo, o preconceito contra ateus. O apresentador Datena exteriorizou em um programa de TV, há alguns anos, o seu preconceito, dizendo que “ateus são pessoas sem limites, por isso matam, cometem essas atrocidades”. Mas temos exemplos de pessoas que frequentam igrejas e cometem crimes como, por exemplo, Elize Matsunaga, que matou e esquartejou o seu marido, o dono da Yoki. Muitos fanáticos religiosos também matam em nome de Deus. Ninguém é assassino só por ser ateu, como ninguém é santo só por frequentar uma igreja.

Outro preconceito presente na sociedade contemporânea é contra pessoas obesas. Obesidade é vista como sinônimo de vida não saudável. Uma vizinha que é professora foi chamada pela diretora da escola para falar sobre “o excesso de peso, pois não é saudável”. A professora perguntou-lhe: “Será que os magros não morrem? Só morremos os gordos?”.

O importante é entender que os preconceitos discriminam pessoas, ofendem, ferem e prejudicam. Gays e héteros, gordos e magros, lindos e feios, ateus e religiosos, somos todos humanos. Simplesmente humanos.

Isabel Furini é escritora e orienta oficinas de escrita literária. e-mail: isabelfurini@hotmail.com

CARÊNCIA EMOCIONAL - Arma de dois gumes?

Quando qualquer discussão começa a tomar caminhos inesperados, não é raro alguma das partes dar o grito de guerra: “Você tem carência emocional”. É a frase pronunciada para demolir o adversário. Daí para frente ele perde terreno, às vezes perde o chão completo, enquanto que a pessoa que usa a frase pode se sentar sobre uma montanha de conforto. A luta já está ganha.

Não importa o que o outro fale, os argumentos dele são nulos. Quem pode dar ouvidos a alguém que fala porque tem carência emocional? A tática é utilizada não só para desqualificar argumentos, mas para desqualificar o argumentador. Uma forma cruel de vencer a luta. Mas é muito interessante porque essa frase de carência emocional no fundo atinge não digamos a todos, mas a maioria das pessoas.

Quem não tem uma carência emocional lá, no fundo, bem guardada? Quem é tão amado quanto quer? Quem é tão popular quanto sonha? Quem conseguiu, realmente, realizar todos os seus sonhos? Tem um amante? Fez cirurgia plástica?  Come demais? Está gordo? Sente-se velho? Tudo isso pode fazer parte da carência emocional. Quer ser famoso? Quer ser o melhor? Quer aplausos? A origem pode ser a mesma. Quer viver uma grande paixão, ser o dono da rua, ser admirado? Carência emocional também.

Reveste-se de milhares de formas. Da necessidade de sentir-se bonito ao desejo de triunfar profissionalmente, do sonho de ter um filho ao sonho de ser famoso em Hollywood. No fundo, o ser humano tem carência, porque o mundo é caleidoscópico, cheio de formas, cores, conteúdos e sonhos irrealizáveis.

Por isso, na próxima vez que em uma discussão alguém triunfante diga que você age desse jeito porque tem carência emocional, responda que ele deveria tirar a máscara de perfeição e olhar para dentro. E tenha certeza, se ele olhar descobrirá em alguma parte da sua mente a “carência emocional”. Afinal até Platão disse que o Amor, o incrível Amor, é filho do Recurso e da Carência. É só ficar sozinho, olhar-se no espelho da verdade e a carência emocional estará lá... gritando muito perto dos ouvidos.

Isabel Furini é escritora e poeta, e-mail: isabelfurini@hotmail.com,
Quadro do artista plástico Carlos Zemek.
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